EXCERTOS SOBRE UM TEXTO DE JACQUES ELLUL
Você concorda?
“A crença provê respostas a nossas perguntas, a fé nunca o faz. Cremos para encontrar segurança, solução, uma resposta para os nossos questionamentos. As pessoas creem para desenvolverem para si um sistema de crenças. A fé (a fé bíblica) é completamente diferente. O propósito da revelação é fazer com que ouçamos as perguntas, e não suprir-nos com explicações”.
“A fé é, em primeira instância, ouvir […] ela ouve pacientemente o silêncio até que o silêncio seja preenchido pelo que ela toma sendo a inquestionável palavra de Deus, palavra da qual se apropria”.
“A fé pressupõe a dúvida, a crença exclui a dúvida”.
“A fé me constrange acima de tudo a avaliar o quanto não vivo pela fé – o quão raramente a fé enche a minha vida. A fé coloca à prova cada elemento da minha vida e do meu contexto social; não poupa nada nem ninguém. Ela é implacável em me levar a questionar todas as minhas convicções: cada uma das minhas moralidades, crenças e posições políticas. A fé me impede de atribuir significado definitivo a qualquer área da atividade humana. Ela me desprende e me livra do dinheiro, da família, do meu emprego e da minha capacidade intelectual”.
“Ela é o caminho mais certo para me levar a admitir que a única coisa que sei é que nada sei. A fé não deixa nada intacto. A única coisa que a fé me traz é o reconhecimento da minha impotência, incapacidade e inadequação. Ela faz com que eu me depare com minha condição de incompleto, e desmascara minha incredulidade (naturalmente a fé é a arma mais certeira e letal contra as crenças em geral)”.
“A dúvida, que constitui parte integral da fé, diz respeito a mim mesmo; não diz respeito à revelação de Deus ou ao seu amor nem à presença de Jesus Cristo. Trata-se da dúvida a respeito da efetividade, até mesmo da legitimidade, daquilo que faço e a respeito das forças a que me submeto na minha igreja e na sociedade. Além disso, a fé coloca a si mesma à prova. Se discirno o tumulto da fé dentro de mim, tenho de adotar como primeira regra não enganar a mim mesmo, não me deixando abandonar à crença indiscriminadamente”.
“A fé é a exigência de que encarnemos o Reino de Deus agora, neste mundo e nesta época”.
“A fé destrói toda a religião e tudo que entendemos como espiritual”.
“Fé não é nem crença nem credulidade. Não é uma aquisição razoável nem um feito intelectual; é mais a conjunção de uma decisão definitiva com uma revelação, e convida-me a efetuar hoje a encarnação da realidade última, o Reino de Deus presente entre nós. Sou intimado por uma Palavra que é eterna, universal e pessoal aqui e agora. Aceitar a intimação. Dispor-se a agir de forma responsável, entrando numa aventura ilógica, sem saber sua origem nem o seu fim. Assim é a fé”.
“Fé é assumir riscos, deixar para trás segurança e tranquilidade, desprezar garantias: é pisar, como o discípulo, para fora do barco no mar da Galileia. Se vivemos pela fé, não há necessidade de implorar que ele nos salve do perigo. Torna-se suficiente saber que ele está ali, mesmo que o perigo se mostre mortal; o que quer que o amor de Deus queira fazer ou esteja fazendo em nós será feito, não importa o quê”.
“Não existe razão objetiva para a fé; a fé tem de ser vivida. A fé não tem origem ou objetivo. No momento que admite qualquer objetivo ela deixa de ser fé. Se você crê em Deus para ser protegido, coberto, curado ou salvo, então não é fé, porque a fé é gratuita”.
“Mas temos de ficar voltando à fé e a sua gratuidade. Se Deus ama e salva a humanidade sem pedir preço algum, ele quer a contrapartida de ser crido e amado sem propósito algum; Deus quer ser crido e amado sem que seja por mero interesse pessoal, simplesmente por nada”.
“A fé é uma constante ação recíproca; ela nunca fica estagnada ou se acomoda. Não se pode encarnar a fé de um modo estático e definitivo. A fé é um perene novo ponto crítico. A fé, portanto é a contínua presença da tentação e uma visão cada vez mais clara da realidade. Ela implica na crítica à religião cristã, às missões civilizadoras, aos códigos morais cristãos impostos de fora; crítica a uma verdade cristã que exclua reivindicações sobre si de qualquer outra área da cultura humana. A fé é o ponto de ruptura, não com os nossos companheiros humanos, mas com as religiões. A fé é levada a prosseguir em criticar, julgar e radicalmente rejeitar todas as reivindicações religiosas humanas”.
“A fé me leva a tomar parte de tudo, e ao mesmo tempo me mostra tudo sob uma luz que não é a razão, a experiência ou o senso comum. Não se trata de uma operação intelectual, é sim uma atitude existencial. A fé traz a luz a nova pessoa manifestada em amor e lucidez”.
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