25/11/2010
‘Não podemos ordenar mulheres’
Acaba de ser publicada a primeira entrevista com um papa na história. Bento XVI admite que o escândalo de Marcial Maciel esteve “muito bem encoberto”.
A reportagem é de Lucia Magi e está publicada no jornal El País, 24-11-2010. A tradução é do Cepat.
O temor e a surpresa após o anúncio de ter sido eleito sucessor de João Paulo II. As forças físicas que começam a minguar aos seus 83 anos. O escândalo dos abusos sexuais. A homossexualidade, a pílula abortiva, o celibato. Pela primeira vez na história do Vaticano, um Papa, Bento XVI, se confessa e o publica.
A entrevista que manteve com o jornalista alemão Peter Seewald durante seu descanso de verão na residência de Castelgandolfo, nos arredores de Roma, prometia marcar um tímido giro da Igreja em temas sociais. Sobretudo, ao transcender queBento XVI defendia em Luz do Mundo o uso limitado do preservativo. Mas não. O giro finalmente não se consuma. No livro, o Papa defende as posturas tradicionais da instituição: não à ordenação de mulheres, não à pílula e sim ao celibato.
– Espanha. “É um país de contrastes dramáticos. Pensemos no contraste entre a República dos anos 30 e Franco, ou entre o atual e dramático choque entre secularismo radical e fé convencida”.
– Pílula. “Se se separam os conceitos de sexualidade e fertilidade então a sexualidade passa a ser qualquer coisa”. “A Igreja aprova a regulação natural da natalidade.”
– Celibato. “Para viver melhor este sinal que os padres dão ao mundo é importante que os sacerdotes não vivam isolados, mas que se reúnam em pequenas comunidades, se apóiem e experimentem juntos seu serviço a Cristo”.
– Mulheres sacerdotes. “Já disse João Paulo II, a Igreja não tem a possibilidade de ordenar as mulheres. Não se trata de não querer, não podemos. O Senhor deu esta forma à Igreja”.
– Homossexuais. “Não têm que ser discriminados por apresentarem aquelas tendências. O respeito pela pessoa é algo absolutamente fundamental e decisivo. Mas o sentido profundo da sexualidade é outro: a reprodução”. “Se alguém apresenta tendências homossexuais claras esta constituirá para ele uma grande prova. Mas a homossexualidade não é moralmente justa”. Também não é conciliável com o sacerdócio, porque então “o celibato como renúncia não tem nenhum sentido.”
– Abusos. “De repente foi como se a cratera de um vulcão se pusesse a vomitar uma grande nuvem de fumaça que suja e escurece tudo. O sacerdócio parecia o lugar da vergonha e qualquer padre era suspeito de ser ‘um deles’. Alguns me contaram que até tinham medo de pegar na mão de um menino”. A dimensão dos abusos foi “um choque”.
– Meios de comunicação. “A ação dos meios de comunicação não era guiada apenas pela busca da verdade, mas também se compraziam em disparar contra a Igreja e desacreditá-la”. Mas precisa: “Quando se trata de trazer à tona a verdade, temos que estar agradecidos. Os meios de comunicação não poderiam ter contado essas coisas se na própria Igreja o mal não existisse”.
– Renúncia. Sobre o escândalo da pedofilia, o jornalista lhe pergunta: “Alguma vez pensou em renunciar?”. A resposta: “Quando o perigo é grande não se pode fugir. Por isso, este não é o momento para renunciar, mas para resistir e superar a dificuldade”. Contudo, “quando um Papa chega à clara consciência de que já não pode física, mental e espiritualmente realizar a sua missão, então tem o direito e, em alguns casos o dever, de renunciar”.
– Legionários de Cristo. Sobre o sacerdote mexicano Marcial Maciel, que fundou em 1941 os Legionários de Cristo e que abusou de seminaristas e teve filhos com diferentes mulheres, Bento XVI é muito claro. “Agimos com muita lentidão e grande atraso. De alguma forma, a história estava muito bem encoberta e só a partir de 2000 começamos a ter provas. Para mim, Maciel segue sendo uma figura misteriosa. Por um lado, existe o tipo de vida que agora conhecemos, além de qualquer moral: uma existência atrevida, esbanjada, torcida. Por outro lado, há o dinamismo e a força com que construiu a comunidade dos Legionários”. De qualquer modo, “em seu conjunto a comunidade é saudável”.
– Islã. É uma “grande realidade religiosa” com que é preciso dialogar, porque são aliados na guerra contra o secularismo. Mas “há muitas maneiras de vivê-lo”. “Onde reina incontrastável, a consciência da verdade se faz tão limitada que se transforma em intolerância e a convivência com os cristãos é difícil”.
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=386465/11/2010