Morreu D. Samuel Ruiz García, bispo emérito de San Cristobal, Chiapas, no México, aos 86 anos de idade.

Samuel Ruiz foi bispo da região de Chiapas e negociou com o Movimento Zapatista, nos anos 1990.

A notícia da sua morte é da Agência Efe, 24-01-2011.

Ele foi um homem muito conhecido e respeitado no México e na América Latina. Trata-se de um bispo da extirpe de um Pedro Casaldáliga, por exemplo.

Ele se tornou um grande defensor dos direitos dos povos indígenas.

Ele foi bispo de San Cristóbal de las Casas, em Chiapas, de 1960 a 2000, quando se tornou bispo emérito.

Em 2008, participou de uma comissão negociadora com o Exército Popular Revolucionário – EPR -, que pedia ao governo mexicano a entrega de dois dos seus militantes desaparecidos.

O bispo atual de San Cristóbal, D. Felipe Arizmendi, disse, durante as celebrações dos 50 anos de ordenação de D. Samuel, em 2009, que a sua vida e vocação ficou marcada “por descobrir e ver de perto a marginalização de uma quantidade enorme de comunidades ante uma situação de dominação generalizada”

Ontem, numa nota, afirmou que D. Samuel Ruiz deixou o legado, com as seguintes caracteristicas:

1.- A promoção integral dos indígenas, para que sejam sujeitos na Igreja e na sociedade;

2.- A opção preferencial pelos pobres e libertação dos oprimidos, como sinal do Reino de Deus;

3.- A liberdade para denunciar as injustiças ante qualquer arbítrio;

4.– A defesa dos direitos humanos;

5.- A inserção pastoral na realidade social e na história;

6.- A inculturação da Igreja, promovendo o que pede o Concílio Vaticano II, que haja igrejas autóctonas, encarnadas nas diferentes culturas indígenas e mestiças;

7.- A promoção da dignidade da mulher e da sua corresponsabilidade na Igreja e na sociedade;

8.- Uma Igreja aberta ao mundo e servidora do povo;

9.- O ecumenismo não somente com as outras confissões cristãs, mas com todas as religiões;

10.- Uma pastoral de conjunto, com responsabilidades compartilhadas;

11.- A Teologia Índia, como busca da presença de Deus nas culturas originárias;

12.- O Diaconato Permanente, com um processo específico entre os indígenas;

13.- A reconciliação nas comunidades;

14.- A unidade na diversidade;

15.- A comunhão afetiva e efetiva com o Sucessor de Pedro e com a Igeja Universal.

O legado de Samuel Ruiz

“É pecaminoso não tentar novas respostas; é egoísta, cômodo e farisaico julgar e condenar apenas de longe, a milhares de quilômetros de distância, sem estar inserido em uma realidade muito diferente de outras. E quando não há abertura para dialogar sobre estes pontos, mas apenas desconfiança e desqualificação, nos desgastamos mutuamente e não discernimos os sinais dos tempos. A Teologia Indígena e o Diaconato Permanente entre os indígenas têm suas complicações, mas são uma busca digna de ser valorizada”, escreve Felipe Arizmendi Esquivel, bispo de San Cristóbal de las Casas, em artigo publicado no sítio espanhol Religión Digital, 26-01-2011. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Ver

Terminou sua passagem por esta terra dom Samuel Ruiz García, bispo emérito de San Cristóbal de las Casas, que presidiu esta diocese de 1960 até 2000. Idolatrado por uns e odiado por outros, já concluiu a sua missão e pedimos seu descanso na paz eterna. Quando cheguei aqui como seu sucessor, já há quase 11 anos, uns me exigiam que não mudasse nada, que em tudo seguisse seus passos, que fizesse exatamente tudo como ele. Outros, ao contrário, esperavam que varresse tudo quanto o lembrasse e que não ficasse vestígio de seus quarenta anos episcopais nesta região de Chiapas. Haja desafio tão desgastante! Quanto custa ser ponte que possa unir lados tão extremos! Uns e outros te pisam; os daqui e os de lá. Mas só assim podes construir unidade, em meio a uma enorme e rica diversidade de atitudes e critérios humanos, teológicos, eclesiais e pastorais. Minha oração, então e agora, é pedir a luz do discernimento evangélico, para não competir, nem destruir, mas complementar.

Julgar

Que legado nos deixa Samuel Ruiz, e que não devemos perder, por suas raízes evangélicas?

Entre outros aspectos, enumero a promoção integral dos indígenas, para que sejam sujeitos na Igreja e na sociedade. A opção preferencial pelos pobres e a libertação dos oprimidos, como sinal do Reino de Deus. A liberdade para denunciar as injustiças diante de qualquer poder arbitrário. A defesa dos direitos humanos. A inserção pastoral na realidade social e na história. A inculturação da Igreja, promovendo as exigências do Concílio Vaticano II, que haja igrejas autóctones, encarnadas nas diferentes culturas, indígenas e mestiças. A promoção da dignidade da mulher de sua corresponsabilidade na Igreja e na sociedade. Uma Igreja aberta ao mundo e servidora do povo. O ecumenismo não só com outras confissões cristãs, mas com qualquer religião. Uma pastoral de conjunto, com responsabilidades compartilhadas. A Teologia Indígena, como busca da presença de Deus nas culturas originárias. O Diaconato Permanente, com um processo específico entre os indígenas. A reconciliação nas comunidades. A unidade na diversidade. A comunhão afetiva e efetiva com o Sucessor de Pedro e com a Igreja universal.

Vários destes aspectos são de fronteira, e portanto delicados, tanto para entendê-los conforme o Evangelho, como aplicá-los em comunhão eclesial. Não é fácil abrir caminhos para responder aos desafios da nova evangelização, porque às vezes não guardamos o equilíbrio necessário e podemos pular ou relativizar algumas normas; mas é mais pecaminoso não tentar novas respostas; é egoísta, cômodo e farisaico julgar e condenar apenas de longe, a milhares de quilômetros de distância, sem estar inserido em uma realidade muito diferente de outras. E quando não há abertura para dialogar sobre estes pontos, mas apenas desconfiança e desqualificação, nos desgastamos mutuamente e não discernimos os sinais dos tempos. A Teologia Indígena e o Diaconato Permanente entre os indígenas têm suas complicações, mas são uma busca digna de ser valorizada.

Quem pode negar a índole evangélica da opção pelos pobres? Quem pode não se envolver na libertação integral dos marginalizados? A quem podem deixar indiferentes as violações dos direitos humanos? Podes voltar o rosto e deixar o coração frio quando vês as injustiças contra os indígenas, contra a mulher, contra os diferentes? Que possa haver radicalismos ideológicos, é verdade; mas pode havê-los em uma parte e em outra. Como necessitamos a luz e a graça do Espírito, para ser fiéis ao projeto do Pai, encarnado em Jesus!

Agir

Tenhamos a abertura humana, cristã e eclesial, para discernir os caminhos do Espírito, à luz do Evangelho e dos desafios atuais, acompanhados pelo Magistério da Igreja, com humildade de uma e outra parte. E o definitivo: amemo-nos, respeitemo-nos, valorizemo-nos, perdoemo-nos, unamo-nos, dentro de nossas legítimas diversidades, pois o definitivo que nos salva é o amor.

28/1/2011

‘Edificar e Plantar’. Morreu Samuel Ruiz, o bispo dos pobres e dos índios

“Samuel Ruiz se converteu em profeta de justiça, advogado dos índios; promoveu a tomada de consciência dos atores sociais e pastorais. Sofreu incompreensão da parte daCúria Romana e calúnias do Estado”, escreve Paulo Suess, assessor teológico do Cimi, em artigo publicado no sítio do CIMI, 27-01-2011.

Eis o artigo.

“Eu vim para evangelizar os índios, mas terminei sendo evangelizado por eles”, disse certa vez Samuel Ruiz García, a quem as comunidades chamavam de “bispo dos pobres e dos povos originários”. Ele morreu segunda-feira (24.1.2011) e muitos choram a ausência de quem dava voz aos sem voz. Foi sepultado na catedral de San Cristóbal, quarta-feira (26).

Imerso nos debates teológicos do Concílio Vaticano II e das subsequentes Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano e do Caribe de Medellin, Pueblae Santo Domingo, Samuel Ruiz foi participante e protagonista da Teologia da Libertação e da opção preferencial pelos pobres desde 1975, em uma época dominada por golpes de Estado e por ditaduras militares na América Latina. Nunca era marxista, como o rotulavam seus detratores. Católico tradicional e ortodoxo, Samuel Ruizchegou a Chiapas em 1959 como bispo da diocese de San Cristóbal.

A realidade o converteu. Algumas regiões de Chiapas viviam com estruturas sociais tão atrasadas que se assemelhavam ao período medieval. Samuel Ruiz se converteu em profeta de justiça, advogado dos índios; promoveu a tomada de consciência dos atores sociais e pastorais. Sofreu incompreensão da parte da Cúria Romana e calúnias do Estado. Seu projeto de promover lideranças indígenas através do diaconato foi bruscamente interrompido. Em 1993, publicou sua Carta Pastoral: “Nesta hora da graça”, na qual advertiu para a gravidade das injustiças contra os povos indígenas.

Nos últimos anos, Samuel Ruiz vivia em Querétaro, 200 quilômetros ao norte da capital do país. Encontrei D. Samuel em várias ocasiões, numa visita a Chiapas, no aeroporto de Lima, em algumas reuniões de pastoral indígena, e, por última vez, num encontro com ex-alunos no México. Sempre nos falava de sua conversão pelos índios. Seu lema episcopal foi: “Edificar e Plantar”. Aludindo a seu lema, assim terminou sua homilia um ano atrás, no dia 25 de janeiro de 2010, por ocasião de suas bodas de ouro episcopal, na praça da catedral de Chiapas: “Damos infinitas graças ao Senhor, Trino e Uno, por nos ter feitos seus filhos e por nos ter chamado como pastor de sua Igreja, para edificar e plantar seu Reino de justiça, de amor e de paz”.

One thought on “Morreu D. Samuel Ruiz García, bispo emérito de San Cristobal, Chiapas, no México, aos 86 anos de idade.

  1. nancy

    ah dom Samuel! tbm eu agradeco a Deus pela vida dele. Perdemos um ponto de referencia importante na teologia e na pastoral. Ele dizia: “Vim evangelizar os indios e eles me evangelizaram” e nunca mais fazer missao foi a mesma coisa.

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