Lula, Presidente da República do Brasil e da República Popular do Corinthians

“Olha, a primeira coisa que nós temos que ter certeza absoluta é que ser corintiano é algo diferente do que ser apenas um simples torcedor de futebol. Um torcedor de futebol comum, ele torce para o seu time ganhar no final de semana, ele quer que o seu time esteja bem colocado na tabela, que seja campeão. Mas um torcedor corintiano, ele é um militante, ou seja, ele está preocupado com o seu time 24 horas por dia, ele está preocupado com o seu time estando bom ou estando ruim. O time do Corinthians talvez seja um dos poucos times do mundo que quando o time está ruim a torcida vai mais ao campo torcer e incentivar mais. Então, eu acho que essa é uma diferença fundamental e uma coisa prazerosa de ser corintiano.” Presidente Lula

Entrevista exclusiva concedida por escrito pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao jornal Agora São Paulo

Publicada em 1º de setembro de 2010

Jornalista: Como se tornou corintiano? De onde vem a paixão, a ponto de a única exigência na época da prisão era ter uma televisão para assistir aos jogos do Timão?

Presidente: Eu cheguei a Santos ainda criança, em 1952, tinha seis anos, e a cidade tinha na época mais torcida do Corinthians do que do próprio Santos, o Pelé ainda não havia surgido. Quer dizer, desde pequeno eu convivia com muito corintiano à minha volta. Mas eu fui me tornar torcedor mesmo em 1954, quando o Timão ganhou o título do quarto centenário da cidade de São Paulo, um título histórico, muito disputado, todo mundo queria vencer. O Corinthians tinha um time extraordinário, uma linha com Claudio, Baltazar, Luisinho, só craque.

Jornalista: Pretende um dia ser presidente do Corinthians ou ajudar o clube de alguma forma direta?

Presidente: O Corinthians tem pessoas competentes trabalhando 24 horas por dia que podem comandar o clube muito bem. Eu, quando deixar a Presidência, vou ajudar das arquibancadas. Uma coisa que para mim vai ser uma paixão vai ser voltar a sentar num estádio, junto da torcida, para falar o palavrão que todo torcedor fala, para gritar. Pode ficar certo de que vão me ver no estádio torcendo. Eu adoro. A torcida, por si só, é um espetáculo – e a torcida do Coringão, a Fiel, é um espetáculo ainda mais extraordinário. As torcidas organizadas brigam muito entre si, eu sou do tempo que a gente sentava do lado de palmeirense, de sãopaulino, hoje o estádio é dividido, mas vou voltar a freqüentar o campo assim mesmo, sempre atrás do meu Corinthians.

Jornalista: Qual foi a maior emoção e a maior decepção com o Corinthians?

Presidente: Ah, a minha maior emoção foi quando a quebra do tabu contra o Santos, em 1968, depois de onze anos sem ganhar. Você veja, eu morei em Santos, me tornei corintiano lá, então, o Santos era um rival muito presente na minha vida. E com Pelé e companhia, dava ainda mais vontade de derrotar. E nós ficamos onze anos sem conseguir, uma eternidade. Graças a Deus que o Paulo Borges e o Flavio marcaram aqueles gols no Pacaembu. Agora, uma grande decepção, um jogo que eu nunca esqueci, foi a perda do Paulista para o São Paulo em 1957. O Corinthians tinha ainda muita gente de 1954, o Claudio, o Luisinho, e o São Paulo com Maurinho, Amauri, Gino, Dino e Canhoteiro. Foi o primeiro jogo que eu vi ao vivo no estádio. Uma tristeza…

Jornalista: Por que o Corinthians tem essa identificação tão forte com o povo?

Presidente: É uma coisa meio inexplicável, mas eu acho que tem a ver com a origem do clube. O time foi fundado por alguns operários, gente trabalhadora, e contam que um deles, o Miguel Bataglia, que foi também o primeiro presidente, disse que o Corinthians ia ser o time do povo e o povo é quem ia fazer o time. E só num clube desses é que poderia ter nascido aquele movimento que misturou futebol com política, que queria liberdade para o povo, a Democracia Corintiana, com pessoas importantes como Sócrates, Casagrande, que não eram e não são apenas jogadores, tinham e têm até hoje consciência política.

Jornalista: O senhor se considera maloqueiro e sofredor? Por quê?

Presidente: Eu costumo dizer que o Corinthians não tem torcida, tem militância, porque é uma paixão, uma grande paixão, como eu vejo que acontece com o pessoal do PT. Eu acho que sou sim um sofredor, porque sou de uma geração que pegou o jejum de 23 anos sem ganhar nada, e foi o tempo em que eu mais fui ao estádio, mais gritei na arquibancada. E foi também, acho, o período que a torcida mais cresceu. Quer dizer, quanto mais o time perdia, mais a gente gostava e torcia. Só pode ser coisa de sofredor, mesmo…

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