Este capítulo primeiro de nossa dissertação tem por objetivo oferecer apenas algumas informações mais gerais sobre a vida de Camus, sem a preocupação de seguir uma cronologia que cubra toda sua vida. Nossa intenção é elaborarmos apenas um pano de fundo de sua vida para melhor entendermos o seu pensamento. Mesmo assim, informações biográficas estão espalhadas por todo o trabalho. Neste capítulo não pretendemos ser exaustivos, uma vez que informações mais detalhadas podem ser facilmente encontradas em literatura específica. Existem excelentes dicionários, comentários e biografias disponíveis que descrevem toda a vida e obra desse que foi um dos maiores escritores da língua francesa.[16]
Seu romance póstumo, O Primeiro Homem, foi encontrado no dia 4 de janeiro de 1960, dentro de uma pasta ainda como um manuscrito de 144 páginas. Sua esposa, Francine e depois sua filha Catherine (nome da mãe de Camus) acabaram por dar-lhe forma para publicá-lo apenas 34 anos depois, quando ninguém mais esperava. A resistência de sua filha naturalmente não recaía sobre o público cativo de Camus, mas sobre as críticas que se fariam à obra. Catherine Camus defende a atualidade da obra de seu pai justificando-se pelo fato de Camus ser o autor mais vendido pela editora Gallimard. Diz ainda que “existem indicações que hoje os intelectuais estão voltando à Camus. A história tem dado razão a ele pela queda do comunismo. Na verdade, o comunismo sempre foi o problema, o responsável pela oposição a Camus. Isto foi sempre, e sobretudo, uma questão política. “[17]
Foi sua crítica contumaz contra o comunismo, assim como contra o cristianismo em O Homem Revoltado que provocou o seu afastamento da elite intelectual francesa do pós-guerra. A amizade, mais propalada do que vivenciada entre Sartre e Camus acabou, após idas e vindas, em Les Temps Modernes com a crueza das palavras de Sartre a Camus que não deixavam de evidenciar alguma verdade sobre Camus: “Uma mistura de suficiência sombria e de vulnerabilidade sempre desencorajou-me de dizer-lhe verdades inteiras. O resultado é que você tornou-se prisioneiro de um desequilíbrio morno, que mascara as suas dificuldades interiores e que você chama, eu creio: equilíbrio mediterrâneo…Você pode ter sido pobre, mas não é mais: é um burguês, como Jeanson e como eu. E a miséria não lhe deu qualquer responsabilidade… Pois afinal de contas de que se trata?…Meu deus Camus como você é sério, e para empregar uma de suas palavras, como você é frívolo! E se você estiver enganado? E se o seu livro testemunhasse simplesmente a sua incompetência filosófica? Se ele tivesse sido feito de conhecimentos reunidos rapidamente e de segunda mão? Se ele somente viesse a dar uma boa Consciência aos privilegiados? … Onde está Meursault, Camus? Onde está Sísifo… Sua moralidade se transformou em moralismo, hoje é só literatura, amanhã será talvez imoralidade”.[18]
A resposta ficou para as anotações pessoais de Camus: “Temps Modernes. Eles admitem o pecado mas recusam a graça…Alguma coisa neles, finalmente, aspira à servidão”.[19]
Camus se ressentiu e isolou-se por alguns anos até que publicou A Queda. Em suas divergências argumentativas, a não ser quando atacado violentamente, como no caso Jeanson[20] e Sartre, Camus sempre procurava resguardar uma atitude amistosa e cordial para com seus oponentes, como que manifestando uma impossibilidade de ir além do tom natural de sua voz, preservando seus críticos como amigos.[21]
Esse seu tom de voz único evidenciava uma bondade e simpatia atraentes que, aliadas a um tom confessional mas paradoxalmente impessoal e emolduradas por sua morte prematura, criaram em torno de Camus uma aura de afeição dificilmente encontrada em outro escritor. Susan Sontag afirma: “Em Camus, qualquer que seja o tema, há sempre uma mescla de juízos pessoais, morais e literários. Nenhum debate de Camus esquece de incluir, ou ao menos sugerir, um tributo à sua bondade e atrativo humanos”.[22] E assim definiu a morte de Camus: “Kafka desperta piedade e terror, Joyce admiração, Proust e Gide respeito, mas nenhum escritor moderno que eu me lembre, exceto Camus, despertou amor. Sua morte em 1960 significou ao mundo literário, uma perda pessoal.” [23] De fato, sua obra é como uma força centrípeta que de seu eixo obscuro arranca sentimentos para mostrá-los a nossas retinas de modo turvo e embaçado, fazendo emergir e interligar pontos comuns de mitologias radicalmente pessoais, como num espelho que, mesmo estilhaçado, ainda traz o esboço de anseios e nostalgias abundantes no inconsciente de seus leitores.
Não é à toa que quase todas as obras de Camus foram publicadas com alguma foto sua. Sua imagem serve para que não demarquemos a linha divisória entre sua vida e sua obra, para que não nos entreguemos somente à sua leitura mas também à sua lembrança, quase sempre trágica. E então, lemos Camus com sua foto impressa em cores fortes no tampão de nossas consciências e, sobretudo, em nossos sentimentos, para sorvermos tudo o que ele pode nos oferecer, obra e vida. Pois sem foto, símbolo de sua vida, sua obra parece perder força.
Personagens trágicos nos atraem. Eles parecem incorporar toda a desmesura que a vida oferece. São, eles mesmos, ofertas de plenitude, desejos, sonhos e intensidades que todos buscam. Eles são a expressão quase lírica da vontade de viver, de renunciar, de buscar; eles carregam o fogo detonador de nossas próprias dinamites mas que sempre se volta contra eles mesmos e os explodem, tirando-lhes aquilo que tinham de mais fulgurante e contraditório, a saber, a vida. Ficamos então como que tateando entre os escombros e as memórias daquilo que eles guardavam e pareciam prometer em sua arte. Resta-nos então a potência nua, a potência da vida que eles carregavam, mas agora desvestida de seu encantador lirismo.
Mas voltemos ao seu livro póstumo, O Homem Revoltado. Neste livro, encontramos a união de vida e obra, a auto-biografia de Camus contada em seu lirismo único. Lá está toda sua simbologia, lá encontramos, na descrição minuciosa dos lugares, personagens e acontecimentos, uma resenha de sua arqueologia pessoal. Lá está como pano de fundo a busca do pai, morto na guerra e que Camus nem conheceu, e a presença amorosa e muda de sua mãe. Aos quarenta anos Jacques Cormery, o nome dado por Camus a ele mesmo, se encontra diante do túmulo de seu pai: “O homem enterrado sob aquela lápide e, que tinha sido seu pai, era mais moço que ele.”[24] Ainda ali Camus percebeu que todos, por mais conhecidos que sejam, morrem no anonimato, sem serem verdadeiramente conhecidos. “Dando as costas ao túmulo, Jacques Cormery abandonou seu pai.”[25]
De sua mãe guardou sempre uma dor evidenciada pela relação de silêncio (sua mãe não ouvia direito e pouco falava) e de diálogos curtos e quase monossilábicos mas onde toda a ternura se manifestava. Assim Camus relata quando de sua infância: “ Era ainda sua avó quem dizia a Jacques que era preciso ir se deitar porque se levantaria às cinco e meia na manhã seguinte, e ele beijava-a primeiro, depois o tio, e para terminar sua mãe, que lhe dava um beijo terno e distraído, voltando à sua postura imóvel, na penumbra, o olhar perdido na rua e na correnteza da vida que passava incansavelmente, enquanto seu filho incansavelmente, um nó na garganta, observava-a no escuro, olhando as costas magras e curvadas, cheio de uma angústia confusa diante de uma infelicidade que não podia compreender.”[26]
Até o fim Camus guardava uma enorme ternura por sua mãe a quem ia visitar sempre, e de onde tomou muitas notas para escrever o livro. Em 1959, Camus foi escolhido para o Prêmio Nobel de Literatura. Ao final de uma de sua entrevistas, respondendo sobre insistentes questões sobre a libertação Argelina, colônia francesa onde havia nascido, que àquela época estava dividida entre os que lutavam por sua libertação e os que a rejeitavam, Camus, depois de quase perder a paciência com um ativista muçulmano, respondeu: “Eu tenho que denunciar também um terrorismo que é exercido cegamente nas ruas da Algéria por exemplo, e que pode algum dia atingir minha mãe ou minha família. Eu acredito na justiça, mas eu defenderei minha mãe primeiro.”[27]
O que foi motivo de riso para os intelectuais da França era exatamente aquilo que direcionava a vida de Camus. Camus era contra qualquer tipo de totalitarismo, fosse de direita ou de esquerda, religioso ou político. Sua adesão a qualquer questão política levava em conta aspectos tanto individuais quanto estruturais. Amava mais o ser humano do que as idéias e achava que estas podiam facilmente perverter o ser humano e fazê-lo um assassino, e o pior, justificá-lo.
Sua vida de comprometimento político não foi fácil. Seu ataque ao comunismo e sua postura rebelde, fizeram-no ficar no meio de um tiroteio entre o grupo de esquerda e o de direita, sobrando-lhe a absoluta falta de compreensão. É o que ele reclama quando escreve: “Cada um e todos contra mim, para destruir-me, exigindo sua parte sem descanso, sem nunca, nunca me oferecerem uma mão, virem ao meu auxílio, me amando finalmente por aquilo que eu sou e ainda, por aquilo que eu posso continuar a ser.”[28]
Em função de sua moderação extremada, para usarmos um termo de Jean Grenier, [29] Camus foi muito pouco compreendido. Como profeta de si mesmo e de seu tempo, Camus antecipou os abusos cometidos pelo comunismo, e acusou o cristianismo de ser um empecilho a uma vida totalmente consciente. Sem as patrulhas de plantão, Camus pode hoje ser melhor entendido.
Sua infância na Argélia foi pobre e feliz como ele define. Por influência e bondade de um professor, Louis Germain, que lhe deu horas extras de ensino, Camus entrou para o Ginásio, mudando neste ponto o rumo de sua vida o que o livrou do trabalho pesado para ajudar no sustento da casa, que seria o seu caminho natural. Depois, trabalhou em diferentes empregos até conseguir seu sustento, ainda precário, como jornalista. Continuou suas leituras de filósofos, romancistas e diversos autores e descobriu no teatro uma de suas grandes paixões onde encontraria a solidariedade e as amizades que nutriam sua vida.
Analisemos um pouco a influência religiosa de Camus. No livro já citado, Camus parece descrever a formação religiosa de sua família simplesmente como um elemento a mais, sem maior relevância. Mais ainda, Camus sugere uma vivência a-religiosa da família. Para afirmar a falta de importância da religião em sua casa, Camus descreve comicamente a reação da avó, que foi na verdade quem o educou, diante da notícia da morte de alguém: “Ninguém ia à missa, ninguém invocava ou ensinava os mandamentos divinos e ninguém tampouco fazia alusão às recompensas e aos castigos do além. Quando se falava em alguém que tinha morrido em frente à avó: ‘Bom’, dizia ela, ‘este aí não vai dar mais pum’. Se se tratasse de alguém por quem ela devesse ao mesmo fingir que tinha afeição: ‘Coitado!’, dizia, ‘ainda tão moço’, mesmo que o defunto já estivesse há muito tempo perto de morrer”[30]
Entretanto, essa aparente educação a-religiosa era imbuída de uma presença cristã que os fazia seguir as ordenanças da igreja como a primeira comunhão de Camus e que surgia também nas brincadeiras e imitações que seu tio fazia do padre e da missa cristã. “Para o tio Ernest, que vivia no nível da sensação, a religião era aquilo eu ele via, isto é, o padre e a pompa. Utilizando seus talentos de cômico, ele não perdia uma só ocasião de imitar a cerimônia da missa, enfeitando-as de onomatopéias (alongadas) que imitavam o latim e, para terminar, imitando ao mesmo tempo os fiéis que baixavam a cabeça ao som da campainha e o padre, se aproveitado dessa atitude, bebia disfarçadamente o vinho da missa.”[31] A imagem da mãe, que era personagem recorrente em seus livros, “era a única cuja doçura podia lembrar a fé, mas justamente a doçura que era toda a sua fé.”
Camus descreve ainda toda a ambiência religiosa de sua casa que, se não era cristã, era tomada pelos ritos e processionais do cristianismo. Dizia ele: “é que a religião fazia parte, para eles, como para a maioria dos argelinos, da vida social, e apenas dela. Eram católicos assim como os franceses, e isso obriga a um certo número de ritos. Na verdade, esses ritos eram exatamente quatro: o batismo, a primeira comunhão, o sacramento do casamento (se houvesse casamento) e os últimos sacramentos.”[32]
As aulas da primeira comunhão lhe trouxeram a amarga lembrança de receber injustamente um tapa no rosto do padre. E assim reagiu: “O menino (Camus) olhou, sem uma lágrima (e em toda a sua vida foram a bondade e o amor que o fizeram chorar, nunca o mal ou a perseguição, que ao contrário tornavam mais forte o seu coração e sua decisão), e voltou para o seu banco. A parte esquerda de seu rosto queimava, ele sentia um gosto de sangue na boca. Com a ponta da língua, descobriu que a parte interna de sua face se cortara com o golpe, e sangrava. Engoliu o sangue.”[33] Nestas aulas, o menino Camus ouvia atentamente a catequese ministrada pelo padre e respondia todas as questões de cor: “Durante todo o resto do curso de catecismo, ele ficou ausente, olhando calmamente o padre, sem queixa mas sem amizade, quando este falava com ele, respondendo de cor, sem erro, às perguntas e respostas que diziam respeito à pessoa divina e ao sacrifício de Cristo,…”[34] Era freqüente às missas mas aquilo tudo não lhe bastava, buscava por mais profundidade: “Mergulhado no trabalho como num mesmo sonho contínuo, perturbado apenas de maneira confusa pelas missas da tarde que se multiplicavam na horrível igreja fria, mas onde o órgão o fazia ouvir uma música que escutava pela primeira vez, pois até então só tinha ouvido coisas estúpidas, sonhando então com mais consistência, mais profundidade, um sonho povoado de reflexos de ouro na semi obscuridade dos objetos e das vestes sacerdotais, indo finalmente ao encontro do mistério, mas de um mistério sem nome, em que as pessoas divinas nomeadas e rigorosamente definidas pelo catecismo nada tinham a fazer e nada a ver, e simplesmente prolongavam o mundo indigente em que ele vivia.”[35]
Sobre a primeira comunhão, de que Camus diz não guardar muitas recordações, é Germain Louis, seu professor da infância quem lembra em uma carta enviada a Camus: “Lembro-me da visita que você fez à nossa sala com seus companheiros de comunhão. Você estava visivelmente feliz e orgulhoso com a roupa que usava e a festa que celebrava. Sinceramente fiquei feliz com sua alegria, imaginando que, se você fazia a comunhão, era porque isso lhe agradava? Então…”[36]
Nessa análise breve de sua infância, Não convém caracterizar Camus como cristão nesta análise breve de sua infância, até porque, ao contrário disso, Camus foi sempre severo com o cristianismo como vamos ver mais à frente. Entretanto, importa elucidar que o cristianismo e seu ideário confessional foi de suma importância na educação de Camus e na formação mesma na estrutura de seu pensamento. Em toda sua obra, Camus irá frequentemente recorrer a termos cristãos. Seus livros falam por si só do uso destes temas: A Queda, O Exílio e o Reino, Jonas, O Estrangeiro, como ressaltaria mais tarde o Padre Bruckberger. Sobre O Homem Revoltado, Camus disse que o primeiro título do livro era “Adão”. André Lahóz, quando da publicação do livro na França, escreve: “O autor cogitou outro título para o livro: ‘Adão’. Como declarou à ‘Il gazzettino’ em 1959, ‘na realidade, cada um de nós é de certa maneira o primeiro homem, o Adão de sua própria história”.[37] Constantemente Camus usa termos cristãos para tecer comentários, como no caso citado entre ele e o grupo da revista Les Temps Modernes. Ele afirma: “Temps Moderns. Eles admitem o pecado mas recusam a graça”.[38]
Todavia, Camus recusará o cristianismo como leitura de mundo. Preferirá a cultura grega como seu referencial. À época de seu curso superior, que entra em contato com a literatura e cultura grega que o fascinam. A seu trabalho final deu o título: A Metafísica Cristã e o Neoplatonismo. Na busca por substituir o corpo de doutrinas cristãs por um outro que se adeque a seu pensamento, Camus achará no pensamento grego aquilo que mais se aproximava de suas idéias. Essa tentativa, porém, somente terá pleno êxito em um sentido aparente, a nosso ver, pois a estrutura sobre a qual constrói seu pensamento é cristã, como veremos mais adiante. Chavanes cita um companheiro de Camus na rede Combat que lhe prestou uma homenagem pessoal, o Padre Bruckberger, que afirmou: “Em toda sua vida, Camus procurou um corpo substitutivo ao cristianismo, quaisquer que tenham sido seus sentimentos pessoais que, seguramente, não eram anticristãos.”[39]
Sua proximidade com o mediterrâneo e seu contato com a natureza, o farão buscar sempre pelo sol invencível, o sol do meio dia que despontará como um ícone de seu pensamento. Em O Homem Revoltado, buscará um ponto médio entre as radicalizações ideológicas da época, e evocará o que ele chamou de pensamento mediterrâneo.
Desde cedo, seu amor à vida o impelirá a sorver tudo que ela pudesse lhe dar. Já cedo sente seu coração abrasado consumir-se pela vida que lhe espera. Em 1936, escreve a Marguerite Dobrenn: “Eu me recordo que há dezoito anos, eram justamente as horas de sono que me pareciam atingir a vida. Eu tinha uma sede furiosa e ávida de tudo o que me esperava, de seres que eu não conhecia, de palavras que eu não havia ainda dito, de obras, de livros, de homens. E de tudo aquilo, eu não podia abandonar nada. Eu não estou seguro de ter mudado…”.[40] A paixão de Camus era a natureza, o sol e o mar, a noite, as pessoas, o futebol, a leitura, o teatro, enfim a vida em todas as suas expressões. Sua dez palavras preferidas eram: “O mundo, a dor, a terra, a mãe, os homens, o deserto, a honra, a miséria, o verão, o mar.”[41] Da abrangência da vida que se lhe apresentava, Camus excluía a vivência religiosa que só assumia sua feição particular frente à natureza. Fora disso, para Camus, não haveria acesso ao sagrado.
Seus textos já evidenciavam sua paixão, como nos jogos de futebol onde era goleiro: “a alegria de vitórias tão maravilhosas (…) mas também pela estúpida vontade de chorar nas noites de derrotas” ou “ em suas caminhadas sobre a praia e ‘a leve angústia da noite num coração de dezesseis anos”.[42]
Seu amor pela vida era paixão avassaladora que o invadia, e essa força que o tomava acabou conduzindo tanto uma regra de conduta quanto o seu próprio pensamento. Os sentimentos acabaram por estabelecer o método de Camus. Foi o sentimento de angústia que se manifestava entre a proposta da vida e a certeza da morte, que o levou à teorização da noção de absurdo. Diante do absurdo, foi um sentimento de solidariedade humana que o levou a estabelecer a noção de revolta. E daí caminhou para um sentimento de moderação.
Em todas essas fases, sempre manifestou uma dificuldade tremenda com a dor, o sofrimento humanos e com a morte. Se antes sua relação era de desprezo motivado pela consciência de que nada se podia fazer contra a única certeza da vida, mais tarde Camus aceitará a morte como algo necessário ao acabamento da vida, assim como o amor. Não aceitará a morte de crianças e jovens feitos para viver e da morte tirará a força de um sentido que ela mesmo não lhe roubará. Presença da esperança no pensamento de Camus, Chavanes observa: “Em 1941, Albert Camus destacou esta reflexão de Tolstoi, da qual ele assinalou as últimas palavras: ‘A existência da morte nos obriga.”[43]
Haverá também sempre em Camus, pela presença constante e ameaçadora da morte, uma preocupação com o presente, a necessidade de se viver agora. Por isso diz: “Pois é preciso viver, com efeito, agora e deixar de desesperar-se”.[44]
A obra de Camus pode ser dividida em três ciclos, a saber, o absurdo, a revolta e o amor, este último eliminado prematuramente pela sua morte. É grande o número de pensadores que influenciaram o pensamento de Camus: Pascal, Nietzsche, Malraux, Grenier, Montherland, Molière, a literatura russa do século XIX, Platão, Agostinho, Kafka, Dostoyevsky, Tolstoy e muitos outros.
Entretanto, Camus não fará uso sistemático das obras que se propõe a estudar o que lhe valeu a crítica de seus adversários acusando-o sempre de usar material de segunda mão, desprovido de um estudo mais acurado. Roger Quilliot atenta acertadamente para a forma como Camus buscava referências nos autores que lia: “Ele emprestou menos idéias ou citações do que atitudes que significavam uma conduta de vida”.[45] Sua intuições davam a ele a força de suas afirmações; na observação de Grenier: “Ele possuía naturalmente um calor humano que não precisava de razões.”[46]
Camus não era um filósofo. Nunca pretendeu sê-lo. Seus livros de idéias, O Mito de Sísifo e O Homem Revoltado não eram tratados filosóficos mas se inseriam antes dentro da tradição do ensaio.[47] Era um apaixonado pelo teatro e fez das palavras a matéria-prima para a produção de sua arte. Dizia ele: “Por que sou um artista e não um filósofo? Ë por que eu penso de acordo com palavras e não de acordo com idéias.”
A obra de Camus parece estar à espera da volta de seu criador. O Primeiro Homem é somente um novo início para um momento inédito que se abriria para Camus. Como diz sua filha Catherine: “Nós devemos nos lembrar que Camus não escreveu nem uma terceira parte do que ele havia desejado escrever. O Primeiro Homem é seu último trabalho póstumo. Entretanto, em um certo sentido, é o seu primeiro trabalho, porque ali você pode ver os sinais de seus compromissos, e também todo o encaminhamento da escrita. Esta mistura de austeridade e sensualidade, o desejo de falar por aqueles que não podem falar por eles mesmos.”[48]
Camus morreu aos 46 anos em um acidente de carro. Moacyr Scliar, fazendo a apresentação de uma reedição de O Avesso e o Direito em português, citou o aforismo: “aqueles a quem os deuses amam morrem jovens”.[49] Camus foi cedo demais.
Também nossos dias parecem ter conhecido essa realidade. Renato Russo, cantor, poeta e profeta de minha geração, provavelmente amado pelos mesmos deus, cantou em uma de suas músicas: “É tão estranho, os bons morrem jovens, assim parece ser quando me lembro de você que acabou indo embora cedo demais. É tão estranho, os bons morrem antes e cedo demais, cedo demais…”[50]
[16] Em português ver: BARRETO, Vicente. Camus, Vida e Obra; LEBESQUE, Morvan. Camus Por Ele Próprio; BRISVILLE, Jean Claude.Albert Camus. Em inglês: LOTTMAN, Herbert R. Albert Camus. A Biography; BRÉE, Germanine. Albert Camus. Em francês: TODD, Olivier. Albert Camus, Une Vie.
[17] WIKINSON, Russel. Solitaire et Solidaire. Rudolf Wikinson talks to Catherine Camus about The First Man. 10/95. Internet. Emaill Russell at: spike.cyberzine@dial. pipex.com . Nesta entrevista, Wikinson observa que O Estrangeiro, depois de 50 anos de sua publicação ainda é o romance mais vendido deste século na França
[18] BARRETO, Vicente. Camus Vida e Obra. p. 25 e LOTTMAN, Herbert R. Albert Camus. A Biography. pp. 529-532
[19] LOTTMAN, Herbert R. Albert Camus. A Biography. p. 533
[20] Francis Jeanson foi o escolhido de fora do grupo de Les Temps Modernes para fazer o comentário que ninguém queria se aventurar sobre O Homem Revoltado. Sua crítica lhe rendeu bons frutos. Após a polêmica toda, Jeanson saiu do mais profundo anonimato e tinha seus trabalhos mais facilmente recebidos por outras revistas e publicadoras.
[21] Sobre isso ver a discussão de Camus com André Breton no caso Lautréamont em LOTTMAN, Herbert R. CAMUS, A Biography. E a discussão com Roland Barthes sobre seu romance A Peste. publicado em português no caderno MAIS! Folha de S. Paulo de 05/01/97
[22] SONTAG, Susan. Contra la Interpretacion. p. 69
[23] Ibid.
[24] CAMUS, Albert. O Primeiro Homem. p. 25
[25] Ibid., p. 28
[26] Ibid., p. 202
[27] LOTTMAN, Herbert R. Op. Cit. p. 649
[28] Ibid., p. 534
[29] Camus dedicou seu livro O Homem Revoltado a Jean Grenier. Grenier era seu amigo pessoal; escreveu um livro, Albert Camus. Recordações, e prefaciou o primeiro volume das obras completas de Camus em francês editado pela Bibliothèque De La Pléiade.
[30] CAMUS, Albert. O Primeiro Homem. p. 147
[31] Ibid., pp. 147-148
[32] Ibid., p. 147
[33] Ibid., p. 152
[34] Ibid.
[35] Ibid.
[36] LOUIS, Germain. In CAMUS, Albert. Op. Cit. p. 311
[37] LAHÓZ, André. Inédito Sobre Camus é Publicado na França. Folha de S. Paulo. Ilustrada. p. 5-3
[38] LOTTMAN, Herbert. R. Op. Cit. p. 521
[39] CHAVANES, François. Il Faut Vivre Maintenant. p. 17
[40] Ibid., p. 48 Obs: a se julgar corretas as datas citadas por Chavanes Camus tinha nessa época somente 5 anos de idade.
[41] CAMUS, Albert. In BRISVILLE, Jean Claude. Op. Cit. p. 231.
[42] Idem. In CHAVANES, Francois. Op. Cit. p.48
[43] CHAVANES, François. Op. Cit. p. 202.
[44] Ibid., p. 15
[45] QUILLIOT, Roger. The Sea and Prisons. p. 90
[46] GRENIER, Jean. Préface. In CAMUS, Albert. Théâtre, Récits, Nouvelles. p. XIX
[47] Ver PINTO, Manuel da Costa. Albert Camus: Um Elogio do Ensaio. Tese de mestrado defendida no Depto de Teoria Literária da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. 15/08/96. Xerox
[48] CAMUS, Catherine. In WIKINSON, Russel. Op. Cit.
[49] Moacyr Scliar. Apresentação. In CAMUS, Albert. O Avesso e o Direito. P. 10
[50] RUSSO, Renato. Love In The Afternoon. CD Descobrimento do Brasil. EMI. 1993
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Olá ,CLÁUDIO CARVALHAES.
AMIGO ,MUITA GENTE FALA DE UM ALBERT CAMUS QUE NUNCA EXISTIU !
VOCE ME PARECE SENSÍVEL AO ASPECTO QUE MUITOS SE ESQUECEM.
“CAMUS ,ERA UM ESTRANGEIRO,E VIVENCIAVA TODO O HORROR DA GUERRA ,E ,TODA DESILUSÃO DO PÓS GUERRA , QUE VEIO ´PÓS TODAS COMEMORAÇÕES DO FINAL DESTA GRANDE CARNIFICINA.
POR EXEMPLO , UM AUTOR ,COMO FERREIRA GULLAR , VIVE UM DRAMA PESSOAL MUITO GRANDE , HÁ EM SUA FAMILIA, DOIS FILHOS COM PROBLEMAS DE “DEMENCIA” ,E,CASOS QUE SE REVELARAM AOS POUCOS ,GOTA A GOTA ,ACESSO A ACESSO,……….COMO FALAR DE FORMA BRANDA ,EM MEIO A UM TERRÍVEL FURACÃO,SEM SER JÓ ?
TANTO ALBERT CAMUS, COMO (UM POUCO MENOS,MAS SEMELHANTE)SARTRE, DESTILARAM ,EM SUAS VIDAS , TODO O HORROR DA GUERRA ,E A CADA MANEIRA PESSOAL, VIVERAM SUAS VIDAS ;
CAMUS SE AGONIAVA , BUSCAVA.
SARTRE ,ACHAVA QUE HAVIA CHEGADO ,CONCLUÍDO .
BUSCAR O QUE ?
ACHAR O QUE ?
QUANDO O QUE SE QUER É A PAZ ,E, A EXPLICAÇÃO DAS MAZELAS DA VIDA . A VIDA AQUI NÃO POSSUI ,NEM DÁ EXPLICAÇÕES.(por enquanto veremos pela metade..PAULO disse).
AMIGO ,”A VIDA TEM QUE ESTAR NO AMOR” , MUITOS FALAM , IDIOTAMENTE , QUANDO NEM A SI AMAM .E HOMENS FORMADOS POR ESTAS UNIVERSIDADES ,QUE FORAM CRIADAS PARA DELINEAR O CAMINHO DO ENGANO HUMANO.(sou pedagogo,fui mecânico de locomotivas,fui órfão de mae,sou cristão,e amo a obra destes homens)
AMIGO , no momento me surpreendí ,pois me peguei gostando de duas musicas que são contextuadamente “homossexual” ,( “octouber symphony”pet shop boys, e, “sissous cut” ART GARFUNKEL , tá ,e daí ,sr. josé marques? o sr é homossexual ? não.
o sr é homofóbico ? não. e então ?
SABE CLÁUDIO , O HOMEM É HIPÓCRITA ,POR NATUREZA. !
hoje um ateu ,está mais perto de DEUS,com seus atos , que 90 % dos “cristãos” , e creio que pessoas ,como SARTRE , CAMUS, GULLAR ,QUE ,MESMO NÃO SOLTANDO MUITOS SORRIZINHOS ,OU , MORALIDADE , SERVIRAM MELHOR A HUMANIDADE ,COM SUAS ANGÚSTIAS E LITERATURA. POIS HOJE , OS ABRAÇOS SÃO CHEIOS DE PONTAS DE FACAS ,INVISÍVEIS, E ESTAMOS CHEIOS DE AUTORES “CRISTÃOS” ,E, ESCRITORES ,QUE COM SUAS SIMPATIAS ,EM TEMPO DE PAZ , CONTRIBUEM PARA A ESCRAVIDÃO DO HOMEM, A ESTES SISTEMAS FALIDOS ,E, QUE TRAZEM TANTAS ANGÚSTIAS E PERPLEXIDADES, como a minha *.
RAPAZ , PERPLEXIDADE DE VER NÃO O SOFRIMENTO DO SOFRIDO , MAS ,A CAPACIDADE DE FAZÊ-LO , OU SEJA , UM HOMEM ,SOBRE OUTRO HOMEM.
EU LHE AGRADEÇO PROFUNDAMENTE O ESPAÇO ,MANO.
AH ,SIM, O HOMOSSEXUALISMO , É PARA NOS ESBOFETIAR A CARA ! CONFUNDIR OS SEXOS , ORA AMIGO , QUAL É MESMO A FUNÇÃO/PAPEL DO HOMEM ,E,QUAL A DA MULHER ? O HOMEM/DEUS ,HOJE ESCOLHE O SEXO DE SEU FILHO,MAS , À FRENTE ,ELE VÊ ,EM SEU FILHO HOMOSSEXUAL , QUE ELE NÃO POSSUI O PODER QUE CRE QUE TEM. MAS ATÉ TEM.APENAS FAZ MAU USO.É SÓ PRA SUBJULGAR AO OUTRO .AGORA IMAGINE UM CAMUS,UM SARTRE ,OU AINDA ,UM JORGE SEMPRUM(MARAVILHOSO), OUVINDO A CANTINELA DOCINHA DE HITLER , SE TRANSFORMANDO NUM MONSTRO , SE REVELANDO ,SE DESPINDO , DAÍ VEM UM STALIN ….
AH AMIGO NEM SEI O QUE EU FARIA ,OU ME TORNARIA.
FICA NA PAZ ,AMIGO , FICA NA PAZ.
JOSÉ MARQUES